Nesse país, se você não acredita em Deus não pode acreditar em coisa alguma. Só a crença na justiça divina para aliviar a inexistência penal brasileira. A vida aqui vale muito pouco. Não vale nada, na verdade. Você pode agredir e logo estará solto, você pode matar e logo estará solto, você pode roubar e logo estará solto. Legalizamos a impunidade. Legalizamos a imoralidade.
Há 25 anos foi assassinada brutalmente a atriz Daniella Perez, com dezoito tesouradas. Por ganância covarde.
Seus assassinos – Guilherme de Pádua (também ator e ressentido com sua pouca participação na novela em que atuava com Daniella) e esposa Paula Thomaz – já estão livres. Na prisão, cumpriram apenas sete anos de uma pena de 19 anos. Em solo americano, receberiam no mínimo prisão perpétua, pela gravidade da tocaia, detalhadamente premeditada, e pela crueza da morte, com requintes de crueldade.
Foi um dos finais de ano mais tristes de minha adolescência, porque admirava Daniella, tínhamos quase a mesma idade na época. Era um espelho de vivacidade e carisma, reconhecida como a namoradinha do Brasil.
Nunca mais confiei na Justiça desde então.
Não dá para imaginar o que ainda sofre a sua mãe, a escritora Glória Perez, talvez uma das mulheres mais fortes e resilientes que já atravessaram as minhas palavras, pois ela não baixou a cabeça, transplantou o coração para o trabalho e seguiu escrevendo e colaborando para a televisão. Qualquer um desistiria de seu ofício e de frequentar o meio profissional onde aconteceu a tragédia. Menos Glória Perez.
O tempo não passou para ela. O tempo permanece vivo dentro dela. Pelo menos, o tempo do amor ninguém pode matar.
Queria ter um por cento de sua fibra. Um por cento de sua oração. Um por cento de sua fé.
A novela em que Daniella estrelava quando morreu tinha um nome emblemático: De Corpo e Alma (1992). Exatamente o que devemos para Glória Perez. Corpo e Alma. Ambos arrancados por uma tesoura que desconhecia o longo, o difícil e o delicado bordado materno necessário para tecer uma vida.
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